segunda-feira, 26 de março de 2012



 VIVER BEM

A vida profissional de uma pessoa reflete nas suas vidas física, mental e social.

A maioria das pessoas não está contente com aquilo que faz, seja pelo salário ou pelo serviço. Esta parece ser uma norma geral beirando a verdadeira. Dificilmente encontramos uma pessoa que ame realmente sua profissão, exercendo-a com dedicação e sendo feliz. E todos nós sabemos que somente será produtivo, próspero e feliz aquele que trabalha com amor àquilo que executa.

Talvez uma solução para acabar momentaneamente o desconforto, seja a aplicação dentro da jornada exaustiva um período de merecido descanso, um intervalo de descontração ou uma fuga mesmo. Quando deve ser deixado de lado todo pensamento relativo ao que está se fazendo e tomar um rumo diametralmente oposto, se afastando, evitando um grande desgaste físico e mental pela constância. Uma quebra abrupta na rotina. Procedimento já adotado em algumas empresas, estabelecendo um pequeno repouso para que os funcionários recuperem as suas energias.

Para a fuga, uma antiga narrativa de Malba Taham serve para ilustrar um exemplo: basicamente todo filósofo é um pescador e todo pescador é um filósofo. Duas profissões distintas e opostas uma a outra. Aquele que é filósofo usa muito o cérebro, deve ir pescar para se descontrair, e todo pescador que usa muito o seu corpo físico no trabalho deve se sentar à beira do rio e meditar, filosofar, assim recuperando o equilíbrio existencial e harmonia na vida.

É a pura verdade. Diz um grande sábio: ‘quando me sinto fatigado de ler e ouvir os filósofos, de analisar, letra a letra, os ensinamentos dos Inspirados, as sentenças dos doutores, os hadis do Profeta, tomo de minha rede, dos meus apetrechos de pesca, e vou, com meu filho mais moço, até o rio fazer um pouco de pescaria. Procuro repouso, para o meu conturbado espírito, tornando-me um pescador. A pesca é, para mim, tranquilidade e paz. Esqueço, por momentos, os problemas torturantes da alma, as inquietações da dúvida....o pescador, absorto na sua faina, não sente passar o tristonho da vida...a vida mais vivida...não é a vida do filósofo é a vida do pescador.’

Assim fica explicado que todo filósofo é um pescador, mas como fica a situação inversa, o pescador é um filósofo? Um grande pescador responde: ‘Mas nada há, nem pode haver, de estranho no fato de um pescador ser filósofo. Muitas e muitas vezes, quando me sinto cansado de pescar, o corpo dolorido pela faina, largo a minha pesada rede, as minhas linhas, a caixa com iscas, e vou até à Mesquita Otman ouvir as lições dos ulemás que ensinam filosofia e debatem os graves problemas do Ser e do Não-Ser. Procuro repousar para a fadiga do meu corpo, tornando-me um filósofo. A filosofia é para mim, tranquilidade e paz. Esqueço, por um momento, os problemas e tropeços de minha vida de pobre, e ponho-me a filosofar. ’ A vida se torna agradável nestes momentos não a sentindo passar, completa ele, ‘a vida mais bem vivida, mas sentida, é a meu ver, não a vida serena do pescador, mas a vida intensa do filósofo’.

Ambos os personagens procuram a forma de viver do outro para encontrar descanso, lazer, fugindo das dificuldades encontradas em suas profissões. É uma pausa que reabastece e revigora o corpo e a mente cansados. Vivem assim a vida por inteiro, trabalhando, comungando e apreciando o que ela revela de belo da Criação e que sacia a fome de viver de maneira inteligente e em paz.

 ‘A vida mais bem vivida terá aquele que viver na Paz, no Dever e no Amor, isto é, aquele que viver na Verdade de Deus!’ (Malba Thahan).

(Publicado no jornal 'Tá na Mão' de Fernandópolis, SP, edição de 24 de março de 2012)

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